domingo, 29 de julho de 2018

COMPENSAÇÃO DE DÍVIDAS COM PRECATÓRIOS – ALTERNATIVA A SER CONSIDERADA PELOS DEVEDORES TRIBUTÁRIOS



 

REGRA GERAL
(CONSTITUIÇÃO FEDERAL, ADCT)



Precatórios no Brasil, como representação de créditos contra os devedores entes públicos, União, Estados Federativos, Distrito Federal e Municípios, inclusive autarquias (genericamente, ente público), reconhecidas por decisão judicial contra as quais não mais caibam recursos, sempre foram tratados com o maior descaso pelos devedores. 

A verdade dessa afirmação é confirmada pela quantidade de alterações na Constituição Federal para tratar desse tema, nos últimos anos, bem como decisões do Supremo Tribunal Federal, no geral favorecendo os devedores. Por exemplo, em 25.03.2015 aquela Suprema Corte havia decidido que os precatórios, previstos para serem pagos em 15 anos pela Emenda Constitucional 62/2009, deveriam ser pagos até 2020 e, a partir de 2021, pagos no ano seguinte. Agora, esse prazo foi prorrogado para até 31.12.2024, conforme será visto a seguir.

Prova de total falta de inteligência se se considerar que enquanto os entes públicos devedores recebem em média 1% de seus créditos tributários e não tributários dos contribuintes e demais devedores que lhes devem, em algum momento deverão pagar os precatórios representativos de suas dívidas reconhecidas judicialmente. Infelizmente, pagam quando querem, muito comumente para os herdeiros dos credores originários porque estes, à época do recebimento, já morreram.

A pergunta que sempre coube é: diante de um cenário aterrador desses em que o ente público não paga sua dívida expressa em precatórios mas também não consegue receber seus créditos dos contribuintes, por que não aceitar que esses títulos (precatórios) sejam utilizados para compensação das dívidas tributárias das quais o ente público é credor, uma vez que não consegue recebê-las eficazmente?

As últimas alterações nessa barafunda foram materializadas pelas Emendas Constitucionais 94 de 15.12.2016 e 99 de 14.12.2017, as quais alteraram as regras para o pagamento de precatórios previstas na Constituição Federal, Atos das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT), arts. 101 e 105 e §§.

A partir delas, os Estados Federativos, Distrito Federal e Municípios com precatórios pendentes de pagamento até 25.03.2015, inclusive até 31.12.2024, devem quitá-los até essa referida data de 31.12.2024 e, para isso, passam a admiti-los para compensação de dívidas tributárias ou não tributárias. O direito de compensação garantido aos contribuintes não é exigível contra a União.

Nesse caso, a condição é que os credores de precatórios próprios, ou adquiridos de terceiros, utilizem-nos para compensação de débitos tributários ou não tributários desde que inscritos na Dívida Ativa dos Estados, DF e Municípios até 25.03.2015. 

As regras devem constar de leis próprias publicadas por esses entes públicos até 01.05.2018. Decorrido esse prazo sem que tenham sido regulamentadas, os credores de precatórios ficam autorizados a promover a compensação, pela via administrativa, independentemente de regulamentação.

ESTADO DE SÃO PAULO
(RESOLUÇÃO PGE 12 DE 02.05.2018)

Para requerer a compensação o interessado deve ser titular de precatório em relação ao qual inexista impugnação, recurso ou defesa. A dívida, tributária ou não tributária a ser compensada deve estar inscrita até 25.03.2015. A dívida não pode ter sido impugnada ou ser objeto de controvérsia administrativa ou judicial (art. 2º e incisos).

O credor do precatório pode ser:

a)   uma coletividade; 
b)   pode ser um credor individual; 
c)   pode ser seu sucessor a qualquer título – o que autoriza a cessão desse crédito por parte do titular original, para terceiro, podendo ser cessionário desse direito, por exemplo, uma empresa que irá utilizá-lo para compensar seu passivo tributário inscrito até 25.03.2015
d)   pode ser o advogado em relação aos honorários de sucumbência decretados em seu favor contra o Estado ou Município e, até mesmo, honorários contratuais decorrentes de pacto celebrado pelo advogado com seu cliente, titular originário do precatório (art. 2º, par. ún.).

Atenção: tal qual ocorre com compensações tributárias federais, primeiramente o crédito será habilitado, por meio eletrônico, no portal da PGE (www.pge.sp.gov.br) mediante preenchimento de formulário instruído com comprovação da titularidade do crédito (credor originário ou sucessor) e inexistência de recurso/defesa pendente (art. 3º). Se o credor for representado por advogado no processo que originou o precatório, só este pode propor o acordo de compensação. Nesse caso, nem mesmo o credor pode propô-lo (art. 3º, par. ún.).

A PGE tem 30 dias, prorrogáveis, para opinar sobre a regularidade formal e material. Concluída essa etapa o Procurador Geral do Estado Adjunto autorizará, ou não, a habilitação do crédito, o que será publicado no Diário Oficial do Estado. 

Se aprovado, o interessado deverá comparecer com os documentos originários apresentados eletronicamente, à PGE, dentro de 90 dias, para efetivar a habilitação, após o que deverá requerer a compensação no site (www.dividaativa.pge.sp.gov.br) mediante preenchimento de formulário próprio (arts. 4º e 5º).

Crédito do precatório e o débito inscrito na Dívida Ativa serão atualizados até a data da formalização do requerimento à PGE do seguinte modo: do crédito do precatório serão deduzidas contribuições e impostos (como IR-Fonte); débito inscrito acrescido dos honorários advocatícios do advogado público mais outras incidências (art. 6º).

Se o contribuinte quiser impugnar esses cálculos, tal impugnação será examinada pelo juízo de origem do precatório nos casos de impugnação do valor do crédito. E pelo juízo da execução, nos casos de impugnação do valor do débito (art. 6º, §§).

Caso inexistam impugnações ou estas tenham sido solucionadas no juízo competente, a obrigação expressa no precatório será baixada no tribunal que expediu o precatório, extinguindo a dívida estatal nele expressa (art. 7º).

MUNICÍPIO DE SÃO PAULO
(LEI 16953 de 12.07.2018)

O Município de São Paulo adota os seguintes critérios para permitir a compensação tributária dos débitos inscritos até 25.03.2015: 

a)   compensação de até 92% do montante atualizado do débito tributário ou não tributário (art. 2º, I); 
b)   os débitos a serem compensados não podem ter sido objeto de parcelamento incentivado anteriormente, como PPI ou PRD (art. 2º, I); 
c)   pode ser utilizado mais de um precatório para a compensação de um único débito inscrito (art. 2º, II);
d)   pode ser utilizado apenas um precatório para a compensação de mais de um débito inscrito (art. 2º, II);
e)   caso o crédito do precatório seja superior ao débito inscrito, o saldo será pago ao seu titular pelo critério de ordem cronológica de pagamento determinada pelo Município, ou seja, entra na vala comum do tratamento conferido pelos entes públicos aos precatórios (art. 2º, § 2º);
f)    caso o valor do débito inscrito seja superior ao crédito do precatório, o saldo deverá ser recolhido ao Município em até 5 parcelas mensais (não inferior a R$ 300,00 para PJ), atualizada mensalmente pela Selic (art. 2º, § 3º);
g)   comprovação da titularidade do precatório (art. 4º, I);
h)  comprovação da inexistência de pendência ou desistência de qualquer impugnação, recurso, medida judicial visando invalidação ou alteração do montante do precatório (art. 4º, II)
i)    inexistência de discussão judicial relativa ao precatório em ação rescisória (art. 4º, III);
j)    comprovação da renúncia ao direito de ação, embargos à execução fiscal e recolhimento da sucumbência, se devida, mais encargos da cobrança judicial e extrajudicial incidentes sobre o débito inscrito (art. 4º, IV);
k)   recolhimento da parcela não compensada (8% do débito inscrito) (art. 4º, V);
l)    autorização para o Município levantar os valores depositados em juízo (art. 4º, VII, “a”).

Pode pedir a compensação:

a)   o titular originário do crédito;
b)   o sucessor por falecimento do titular originário, inclusive cessionário desde que, neste caso, tenha sido comunicado por petição protocolizada, ao Tribunal que determinou a expedição do precatório e também o órgão devedor ou, se for de natureza tributária, a Fazenda Municipal (CF, art. 100, § 14 c/c Lei 16953/18, art. 3º, § 1º, II). – o que autoriza a cessão desse crédito por parte do titular original, para terceiro, podendo ser cessionário desse direito, por exemplo, uma empresa que irá utilizá-lo para compensar seu passivo tributário inscrito até 25.03.2015;
c)   cessionário com anuência do advogado que atuou na origem do precatório (art. 3º, § 2º) e apresentação do instrumento de cessão (art. 3º, § 4º);
d)   todos os herdeiros ou espólio representado pelo inventariante (art. 3º, § 3º);
e)   advogado, para compensação de seus débitos inscritos com honorários sucumbenciais (art. 3º, § 5º) ou honorários contratuais (art. 3º, § 6º).

O requerimento de compensação será apreciado por uma Comissão Especial de Julgamento de Requerimento de Compensação (art. 6º), de cuja decisão, se desfavorável, caberá um único recurso (art. 8º). Já se deferido, o interessado deverá efetuar o recolhimento do saldo residual do débito inscrito, no prazo de 15 dias sob pena de cancelamento do pedido ou efetuar seu parcelamento (art. 7º, § 1º).

Se autorizada a compensação a Procuradoria Geral do Município registrará a extinção ou a quitação parcial do precatório em seu sistema e informará sobre a compensação tributária ou não tributária à Secretaria Municipal da Fazenda (art. 9º, I e II) e comunicará ao Tribunal a extinção ou a quitação parcial do precatório (art. 9º, III).

Referida lei municipal será regulamentada até 10.09.2018 (art. 11).

SEGURANÇA NA AQUISIÇÃO DE PRECATÓRIOS

É possível antever que, porque agora regulamentado, o mercado de precatórios será muito mais seguro para as empresas contribuintes que os adquirirão de credores dos entes públicos (cedentes). De todo modo, recomenda-se que o pagamento pela aquisição desses créditos somente seja formalizado após confirmação de sua aceitação pelos Estados, DF e Municípios contra os quais sejam apresentados para compensação.

Franco Advogados Associados

29 de julho de 2018

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terça-feira, 24 de julho de 2018

SÓCIO FALECIDO, EXCLUÍDO, RETIRANTE, INCAPAZ – QUAL A REGRA LEGAL APLICÁVEL NA OMISSÃO DO CONTRATO/ESTATUTO: CÓDIGO CIVIL OU CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL?






As regras a seguir expostas são aplicáveis às Sociedades Simples, Ltda e Sociedades Anônimas de capital fechado. Tratam-se de dissolução parcial de sociedades por exclusão de sócio, inclusive por incapacidade, retirada de sócio, falecimento de sócio. 

Dado que no contrato social ou estatuto é legalmente admitida disciplina diferente daquela abaixo reproduzida, previstas nos Códigos Civil e Processual Civil, recomenda-se, sempre, que tais contratos/estatutos contenham regras pormenorizadas disciplinando a forma de apuração de haveres, forma e prazo de pagamento, aos herdeiros de sócio falecido, ao próprio sócio retirante ou ao sócio excluído.

Inclusive previsão sobre se os herdeiros do sócio falecido serão admitidos na sociedade, ou não, isto porque sua admissão na sociedade nem sempre é recomendável, seja porque a harmonia natural com o sócio falecido pode não existir em relação aos seus herdeiros, assim como a capacidade técnica, gerencial ou administrativa dos herdeiros pode não justificar sua admissão nos quadros sociais já que podem nada ter a contribuir com o êxito do negócio.

Ressalte-se: na omissão do contrato social ou do estatuto serão aplicáveis as regras do Código Civil e as do Código de Processo Civil, como será visto abaixo, evidenciados alguns pontos conflitantes entre si. Mas, também, as da Lei 6.404/76 (Lei das S/As, art. 208 e seguintes), ainda nos casos em que o contrato social preveja a aplicação supletiva da Lei das S/As (Código Civil, art. 1053, par. ún.). Lembrando que à dissolução sucede-se a liquidação da empresa.

Cabe, por sua relevância, esclarecer que o Quadro Sinótico abaixo não foi estruturado visando correlacionar dispositivos do Código Civil com seu equivalente do Código de Processo Civil.



CÓDIGO CIVIL 
(CC)
COMENTÁRIOS
CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL (CPC)
COMENTÁRIOS

Da Sociedade Simples
Da Resolução da Sociedade em Relação a um Sócio
Art. 1.028. No caso de morte de sócio, liquidar-se-á sua quota, salvo:
I - se o contrato dispuser diferentemente;
II - se os sócios remanescentes optarem pela dissolução da sociedade;
III - se, por acordo com os herdeiros, regular-se a substituição do sócio falecido.

O art. 1028 CC dispõe sobre situação da sociedade em relação ao sócio falecido.
Se o contrato social for omisso quanto às regras aplicáveis no falecimento do sócio, suas quotas são liquidadas, isto é, a sociedade é dissolvida em relação ao falecido.
Nesse caso, os haveres devem ser apurados sempre preservada situação de igualdade entre os sócios, inclusive em relação aos herdeiros. 
Entendemos que as mesmas regras decorrentes do entendimento do STF e STJ relativas à igualdade na apuração dos haveres são do mesmo modo aplicáveis aos direitos dos herdeiros.


Dos Procedimentos Especiais
Da Ação de Dissolução Parcial de Sociedade
Art. 599.  A ação de dissolução parcial de sociedade pode ter por objeto:
I - a resolução da sociedade empresária contratual ou simples em relação ao sócio falecido, excluído ou que exerceu o direito de retirada ou recesso; e
II - a apuração dos haveres do sócio falecido, excluído ou que exerceu o direito de retirada ou recesso; ou
III - somente a resolução ou a apuração de haveres.
§ 1o  A petição inicial será necessariamente instruída com o contrato social consolidado.
§ 2o  A ação de dissolução parcial de sociedade pode ter também por objeto a sociedade anônima de capital fechado quando demonstrado, por acionista ou acionistas que representem cinco por cento ou mais do capital social, que não pode preencher o seu fim.
O art. 599 CPC dispõe sobre processo judicial em relação ao sócio falecido. Mas abrange também o sócio excluído, o sócio retirante e, ainda, aquele que exerceu direito de recesso(afastamento).
Nesse caso, se a disputa for levada ao Judiciário, aplicável o entendimento do STF e STJ os quais já estabeleceram dever ser assegurado ao sócio retirante situação de igualdade na apuração de seus haveres, não podendo acarretar a ele resultado patrimonial pior do que se promovida dissolução total.
Se o sócio discordar das regras previstas no contrato ou no estatuto, deve ser levantado balanço de determinação, ou seja, patrimônio líquido real, cujos ativos (inclusive intangível, se for o caso) são avaliados a valor de mercado, como se o ativo e o passivo fossem realizados, para com isso apurar o acervo líquido da sociedade como se ela estivesse sendo dissolvida.
Balanço de determinação se diferencia de balanço de liquidação porque neste último há exclusão dos bens intangíveis.
Art. 1.029. Além dos casos previstos na lei ou no contrato, qualquer sócio pode retirar-se da sociedade; se de prazo indeterminado, mediante notificação aos demais sócios, com antecedência mínima de sessenta dias; se de prazo determinado, provando judicialmente justa causa.
Parágrafo único. Nos trinta dias subsequentes à notificação, podem os demais sócios optar pela dissolução da sociedade.

Já este art. 1029 disciplina a hipótese de sócio retirante, cujas regras processuais aplicáveis estão dispostas nos arts. 599, 600 e 601 CPC.

Art. 600.  A ação pode ser proposta:
I - pelo espólio do sócio falecido, quando a totalidade dos sucessores não ingressar na sociedade;
II - pelos sucessores, após concluída a partilha do sócio falecido;
III - pela sociedade, se os sócios sobreviventes não admitirem o ingresso do espólio ou dos sucessores do falecido na sociedade, quando esse direito decorrer do contrato social;
IV - pelo sócio que exerceu o direito de retirada ou recesso, se não tiver sido providenciada, pelos demais sócios, a alteração contratual consensual formalizando o desligamento, depois de transcorridos 10 (dez) dias do exercício do direito;
V - pela sociedade, nos casos em que a lei não autoriza a exclusão extrajudicial; ou
VI - pelo sócio excluído.
Parágrafo único.  O cônjuge ou companheiro do sócio cujo casamento, união estável ou convivência terminou poderá requerer a apuração de seus haveres na sociedade, que serão pagos à conta da quota social titulada por este sócio.
Nas situações disciplinadas pelo art. 599 CPC, o art. 600 CPC dispõe sobre quem é o titular da ação e quando poderá propô-la, nos casos de sócio falecido (I a III), sócio retirante (IV), sócio excluído (V e VI), inclusive cônjuge ou companheiro de sócio nos casos de cessação do convívio familiar (par. ún.), para cuja hipótese chama-se a atenção, dada a sua relevante importância e talvez até mesmo desconhecimento de muitos operadores do Direito.
Art. 1.030. Ressalvado o disposto no art. 1.004 e seu parágrafo único, pode o sócio ser excluído judicialmente, mediante iniciativa da maioria dos demais sócios, por falta grave no cumprimento de suas obrigações, ou, ainda, por incapacidade superveniente.
Parágrafo único. Será de pleno direito excluído da sociedade o sócio declarado falido, ou aquele cuja quota tenha sido liquidada nos termos do parágrafo único do art. 1.026.

O art. 1030 traz regras aplicáveis ao sócio excluído por falta grave e sócio excluído por incapacidade.Também sócio falido e sócio executado por dívida em relação à qual o credor requeira liquidação das quotas do devedor.
Art. 601.  Os sócios e a sociedade serão citados para, no prazo de 15 (quinze) dias, concordar com o pedido ou apresentar contestação.
Parágrafo único.  A sociedade não será citada se todos os seus sócios o forem, mas ficará sujeita aos efeitos da decisão e à coisa julgada.


O art. 601 CPC complementa a regra processual aplicável nos casos abrangidos pelos arts. 599 e 600 CPC.
Art. 1.031. Nos casos em que a sociedade se resolver em relação a um sócio, o valor da sua quota, considerada pelo montante efetivamente realizado, liquidar-se-á, salvo disposição contratual em contrário, com base na situação patrimonial da sociedade, à data da resolução, verificada em balanço especialmente levantado.
§ 1o   O capital social sofrerá a correspondente redução, salvo se os demais sócios suprirem o valor da quota.
§ 2o   A quota liquidada será paga em dinheiro, no prazo de noventa dias, a partir da liquidação, salvo acordo, ou estipulação contratual em contrário.

Se o contrato social ou estatuto não dispuser de modo contrário, a quota liquidada deve ser paga em dinheiro em 90 dias contados da liquidação do valor da quota apurada com base na situação patrimonial levantada em balanço especial, na referida data da liquidação (vide art. 604 do CPC)
Art. 602.  A sociedade poderá formular pedido de indenização compensável com o valor dos haveres a apurar

Se a sociedade tiver que assumir os ônus financeiros do sócio falecidosócio retirantesócio excluído, poderá ela requerer abatimento desse ônus com o valor dos haveres dele que serão subsequentemente apurados.
Art. 1.032. A retirada, exclusão ou morte do sócio, não o exime, ou a seus herdeiros, da responsabilidade pelas obrigações sociais anteriores, até dois anos após averbada a resolução da sociedade; nem nos dois primeiros casos, pelas posteriores e em igual prazo, enquanto não se requerer a averbação.

As obrigações da sociedade, em especial a tributária, anteriores à saída, prosseguem sendo do sócio retirantesócio excluído e sócio falecido (inclusive de seus herdeiros) por até dois anos após averbação na Junta Comercial, ou Cartório, formalizando a saída dele.
Já nos casos de sócio retirante e sócio excluído, incluem-se as responsabilidades sobre obrigações posteriores à sua saída e pelo mesmo prazo de dois anos.
Por desconhecer isto, são inúmeras as ocorrências de sócios que, por deixarem de formalizar sua saída, prosseguem se responsabilizando pelo passivo social de sociedade da qual já não mais participam.
Art. 603.  Havendo manifestação expressa e unânime pela concordância da dissolução, o juiz a decretará, passando-se imediatamente à fase de liquidação.
§ 1o   Na hipótese prevista no caput, não haverá condenação em honorários advocatícios de nenhuma das partes, e as custas serão rateadas segundo a participação das partes no capital social.
§ 2o   Havendo contestação, observar-se-á o procedimento comum, mas a liquidação da sentença seguirá o disposto neste Capítulo.

A liquidação da sentença obedece ao rito previsto no capítulo “Dos Procedimentos Especiais” do CPC, mas a contestação eventualmente oposta, seguirá o rito comum.
Da Dissolução
Art. 1.033. Dissolve-se a sociedade quando ocorrer:
I - o vencimento do prazo de duração, salvo se, vencido este e sem oposição de sócio, não entrar a sociedade em liquidação, caso em que se prorrogará por tempo indeterminado;
II - o consenso unânime dos sócios;
III - a deliberação dos sócios, por maioria absoluta, na sociedade de prazo indeterminado;
IV - a falta de pluralidade de sócios, não reconstituída no prazo de cento e oitenta dias;
V - a extinção, na forma da lei, de autorização para funcionar.
Parágrafo único. Não se aplica o disposto no inciso IV caso o sócio remanescente, inclusive na hipótese de concentração de todas as cotas da sociedade sob sua titularidade, requeira, no Registro Público de Empresas Mercantis, a transformação do registro da sociedade para empresário individual ou para empresa individual de responsabilidade limitada, observado, no que couber, o disposto nos arts. 1.113 a 1.115 deste Código.
Um antigo problema relativo à pluralidade de sócios está contornado pelas disposições do art. 1033, parágrafo único, ao permitir que a sociedade que por ter perdido um dos sócios passou a ser de titularidade de um único sócio, seja transformada em empresa individual ou EIRELI.
Art. 604.  Para apuração dos haveres, o juiz:
I - fixará a data da resolução da sociedade;
II - definirá o critério de apuração dos haveres à vista do disposto no contrato social; e
III - nomeará o perito.
§ 1o  O juiz determinará à sociedade ou aos sócios que nela permanecerem que depositem em juízo a parte incontroversa dos haveres devidos.
§ 2o  O depósito poderá ser, desde logo, levantando pelo ex-sócio, pelo espólio ou pelos sucessores.
§ 3o  Se o contrato social estabelecer o pagamento dos haveres, será observado o que nele se dispôs no depósito judicial da parte incontroversa.

A regra do art. 604 CPC deve ser interpretada em consonância com a do art. 1031 CC. Ou seja, a fixação da data de resolução da sociedade deve ser, salvo disposição contratual em contrário, aquela em que ocorreu a liquidação do valor da quota apurada em balanço especial levantado na referida data. A propósito, data da resolução é aquela em que ocorreu a extinção do vínculo societário, isto é, quando o sócio deixa de ser titular de direito e obrigações sociais, quer em relação à sociedade, quer em relação aos demais sócios.
Assim como o critério de apuração dos haveres deve ser aquele previsto no contrato social/estatuto ou, na falta deste, com base em balanço especialmente levantado para tal fim (CC, art. 1031).
Afinal, a regra do direito material (Código Civil) deve prevalecer sobre a de direito processual (Código Processual Civil). A LC 95/98, que dispõe sobre regras de elaboração legislativa, determina que o mesmo assunto não poderá ser disciplinado por mais de uma lei, salvo se a subsequente se destinar a complementar a lei básica, que não é o caso do CPC em relação ao CC, e ainda, quando o fizer, vinculando-se a esta por remissão expressa (art. 7º, IV).
Art. 1.034. A sociedade pode ser dissolvida judicialmente, a requerimento de qualquer dos sócios, quando:
I - anulada a sua constituição;
II - exaurido o fim social, ou verificada a sua inexequibilidade.


Art. 605.  A data da resolução da sociedade será:
I - no caso de falecimento do sócio, a do óbito;
II - na retirada imotivada, o sexagésimo dia seguinte ao do recebimento, pela sociedade, da notificação do sócio retirante;
III - no recesso, o dia do recebimento, pela sociedade, da notificação do sócio dissidente;
IV - na retirada por justa causa de sociedade por prazo determinado e na exclusão judicial de sócio, a do trânsito em julgado da decisão que dissolver a sociedade; e
V - na exclusão extrajudicial, a data da assembleia ou da reunião de sócios que a tiver deliberado.

Os comentários imediatamente acima são igualmente válidos na aplicação do art. 605 CPC. Veja-se que, para cada evento (falecimento; retirada imotivada; recesso; retirada por justa causa e exclusão judicial; exclusão extrajudicial) o legislador processual civil foi prevendo a data de resolução da sociedade. Mas o Código Civil (art. 1031) não faz tais distinções. 
De todo modo, as Câmaras Reservadas de Direito Empresarial do TJSP vêm aplicando as disposições do art. 605 em diversos julgados, embora também existam decisões adotando a data da notificação prevista no Código Civil, art. 1029.
Art. 1.035. O contrato pode prever outras causas de dissolução, a serem verificadas judicialmente quando contestadas.

Além das causas de dissolução da sociedade previstas no art. 1034, CC, outras poderão constar do contrato social. 
Art. 606.  Em caso de omissão do contrato social, o juiz definirá, como critério de apuração de haveres, o valor patrimonial apurado em balanço de determinação, tomando-se por referência a data da resolução e avaliando-se bens e direitos do ativo, tangíveis e intangíveis, a preço de saída, além do passivo também a ser apurado de igual forma.
Parágrafo único.  Em todos os casos em que seja necessária a realização de perícia, a nomeação do perito recairá preferencialmente sobre especialista em avaliação de sociedades.

Da mesma forma o art. 606 contradiz a regra geral prevista no art. 1031 CC quanto ao critério de apuração de haveres na hipótese de omissão do contrato/estatuto. O disciplinamento via CPC fazia sentido na vigência do CPC de 1973, omisso que era em relação à dissolução de sociedade, quando então eram aplicadas as do CPC de 1939. Mas agora, com expresso disciplinamento do Código Civil, não fazem sentido tais previsões promovidas por um Código Processual Civil, por não se tratarem de regras de direito material, próprias do Código Civil.
Inclusive porque a avaliação dos ativos e passivos a preço de saída, tal qual prevista no CPC, porque presume uma venda forçada a preços extremamente reduzidos, bem abaixo do custo, pode impor ao sócio retirante enorme ônus. Essa base de avaliação é normalmente aplicada quando a empresa espera ser desativada em futuro próximo.
Art. 1.036. Ocorrida a dissolução, cumpre aos administradores providenciar imediatamente a investidura do liquidante, e restringir a gestão própria aos negócios inadiáveis, vedadas novas operações, pelas quais responderão solidária e ilimitadamente.
Parágrafo único. Dissolvida de pleno direito a sociedade, pode o sócio requerer, desde logo, a liquidação judicial.

Os arts. 1036 a 1038 CC dispõem sobre a figura do liquidante.
Art. 607.  A data da resolução e o critério de apuração de haveres podem ser revistos pelo juiz, a pedido da parte, a qualquer tempo antes do início da perícia.

A parte prejudicada com o critério de apuração e pagamento prevista no CPC poderá pedir ao juiz a aplicação daquelas contempladas no CC. Ou, então, aquelas previstas no contrato social/estatuto, se este as contiver.
Art. 1.037. Ocorrendo a hipótese prevista no inciso V do art. 1.033, o Ministério Público, tão logo lhe comunique a autoridade competente, promoverá a liquidação judicial da sociedade, se os administradores não o tiverem feito nos trinta dias seguintes à perda da autorização, ou se o sócio não houver exercido a faculdade assegurada no parágrafo único do artigo antecedente.
Parágrafo único. Caso o Ministério Público não promova a liquidação judicial da sociedade nos quinze dias subsequentes ao recebimento da comunicação, a autoridade competente para conceder a autorização nomeará interventor com poderes para requerer a medida e administrar a sociedade até que seja nomeado o liquidante.


Art. 608.  Até a data da resolução, integram o valor devido ao ex-sócio, ao espólio ou aos sucessores a participação nos lucros ou os juros sobre o capital próprio declarados pela sociedade e, se for o caso, a remuneração como administrador.
Parágrafo único. Após a data da resolução, o ex-sócio, o espólio ou os sucessores terão direito apenas à correção monetária dos valores apurados e aos juros contratuais ou legais.

É de se alertar que até a data da resolução da sociedade, o ex-sócio, espólio, sucessores, prosseguem fazendo jus aos lucros, juros sobre capital próprio e pro-labore.
E, após a resolução, à correção dos valores apurados e juros previstos no contrato social/estatuto, ou no Código Civil, art. 406, isto é, juros equivalentes à taxa Selic.
Art. 1.038. Se não estiver designado no contrato social, o liquidante será eleito por deliberação dos sócios, podendo a escolha recair em pessoa estranha à sociedade.
§ 1o O liquidante pode ser destituído, a todo tempo:
I - se eleito pela forma prevista neste artigo, mediante deliberação dos sócios;
II - em qualquer caso, por via judicial, a requerimento de um ou mais sócios, ocorrendo justa causa.
§ 2o A liquidação da sociedade se processa de conformidade com o disposto no Capítulo IX, deste Subtítulo.


Art. 609.  Uma vez apurados, os haveres do sócio retirante serão pagos conforme disciplinar o contrato social e, no silêncio deste, nos termos do § 2º do art. 1.031 da Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002.

Finalmente, aqui, situação em que as regras da LC 95/98, relativas à remissão feita pelo CPC mandando aplicar as previsões do Código Civil, são respeitadas.



Franco Advogados Associados


24 de julho de 2018