REGRA GERAL
(CONSTITUIÇÃO FEDERAL, ADCT)
Precatórios no Brasil, como representação de créditos contra os devedores entes públicos, União, Estados Federativos, Distrito Federal e Municípios, inclusive autarquias (genericamente, ente público), reconhecidas por decisão judicial contra as quais não mais caibam recursos, sempre foram tratados com o maior descaso pelos devedores.
A verdade dessa afirmação é confirmada pela quantidade de alterações na Constituição Federal para tratar desse tema, nos últimos anos, bem como decisões do Supremo Tribunal Federal, no geral favorecendo os devedores. Por exemplo, em 25.03.2015 aquela Suprema Corte havia decidido que os precatórios, previstos para serem pagos em 15 anos pela Emenda Constitucional 62/2009, deveriam ser pagos até 2020 e, a partir de 2021, pagos no ano seguinte. Agora, esse prazo foi prorrogado para até 31.12.2024, conforme será visto a seguir.
Prova de total falta de inteligência se se considerar que enquanto os entes públicos devedores recebem em média 1% de seus créditos tributários e não tributários dos contribuintes e demais devedores que lhes devem, em algum momento deverão pagar os precatórios representativos de suas dívidas reconhecidas judicialmente. Infelizmente, pagam quando querem, muito comumente para os herdeiros dos credores originários porque estes, à época do recebimento, já morreram.
A pergunta que sempre coube é: diante de um cenário aterrador desses em que o ente público não paga sua dívida expressa em precatórios mas também não consegue receber seus créditos dos contribuintes, por que não aceitar que esses títulos (precatórios) sejam utilizados para compensação das dívidas tributárias das quais o ente público é credor, uma vez que não consegue recebê-las eficazmente?
As últimas alterações nessa barafunda foram materializadas pelas Emendas Constitucionais 94 de 15.12.2016 e 99 de 14.12.2017, as quais alteraram as regras para o pagamento de precatórios previstas na Constituição Federal, Atos das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT), arts. 101 e 105 e §§.
A partir delas, os Estados Federativos, Distrito Federal e Municípios com precatórios pendentes de pagamento até 25.03.2015, inclusive até 31.12.2024, devem quitá-los até essa referida data de 31.12.2024 e, para isso, passam a admiti-los para compensação de dívidas tributárias ou não tributárias. O direito de compensação garantido aos contribuintes não é exigível contra a União.
Nesse caso, a condição é que os credores de precatórios próprios, ou adquiridos de terceiros, utilizem-nos para compensação de débitos tributários ou não tributários desde que inscritos na Dívida Ativa dos Estados, DF e Municípios até 25.03.2015.
As regras devem constar de leis próprias publicadas por esses entes públicos até 01.05.2018. Decorrido esse prazo sem que tenham sido regulamentadas, os credores de precatórios ficam autorizados a promover a compensação, pela via administrativa, independentemente de regulamentação.
ESTADO DE SÃO PAULO
(RESOLUÇÃO PGE 12 DE 02.05.2018)
Para requerer a compensação o interessado deve ser titular de precatório em relação ao qual inexista impugnação, recurso ou defesa. A dívida, tributária ou não tributária a ser compensada deve estar inscrita até 25.03.2015. A dívida não pode ter sido impugnada ou ser objeto de controvérsia administrativa ou judicial (art. 2º e incisos).
O credor do precatório pode ser:
a) uma coletividade;
b) pode ser um credor individual;
c) pode ser seu sucessor a qualquer título – o que autoriza a cessão desse crédito por parte do titular original, para terceiro, podendo ser cessionário desse direito, por exemplo, uma empresa que irá utilizá-lo para compensar seu passivo tributário inscrito até 25.03.2015;
d) pode ser o advogado em relação aos honorários de sucumbência decretados em seu favor contra o Estado ou Município e, até mesmo, honorários contratuais decorrentes de pacto celebrado pelo advogado com seu cliente, titular originário do precatório (art. 2º, par. ún.).
Atenção: tal qual ocorre com compensações tributárias federais, primeiramente o crédito será habilitado, por meio eletrônico, no portal da PGE (www.pge.sp.gov.br) mediante preenchimento de formulário instruído com comprovação da titularidade do crédito (credor originário ou sucessor) e inexistência de recurso/defesa pendente (art. 3º). Se o credor for representado por advogado no processo que originou o precatório, só este pode propor o acordo de compensação. Nesse caso, nem mesmo o credor pode propô-lo (art. 3º, par. ún.).
A PGE tem 30 dias, prorrogáveis, para opinar sobre a regularidade formal e material. Concluída essa etapa o Procurador Geral do Estado Adjunto autorizará, ou não, a habilitação do crédito, o que será publicado no Diário Oficial do Estado.
Se aprovado, o interessado deverá comparecer com os documentos originários apresentados eletronicamente, à PGE, dentro de 90 dias, para efetivar a habilitação, após o que deverá requerer a compensação no site (www.dividaativa.pge.sp.gov.br) mediante preenchimento de formulário próprio (arts. 4º e 5º).
Crédito do precatório e o débito inscrito na Dívida Ativa serão atualizados até a data da formalização do requerimento à PGE do seguinte modo: do crédito do precatório serão deduzidas contribuições e impostos (como IR-Fonte); débito inscrito acrescido dos honorários advocatícios do advogado público mais outras incidências (art. 6º).
Se o contribuinte quiser impugnar esses cálculos, tal impugnação será examinada pelo juízo de origem do precatório nos casos de impugnação do valor do crédito. E pelo juízo da execução, nos casos de impugnação do valor do débito (art. 6º, §§).
Caso inexistam impugnações ou estas tenham sido solucionadas no juízo competente, a obrigação expressa no precatório será baixada no tribunal que expediu o precatório, extinguindo a dívida estatal nele expressa (art. 7º).
MUNICÍPIO DE SÃO PAULO
(LEI 16953 de 12.07.2018)
O Município de São Paulo adota os seguintes critérios para permitir a compensação tributária dos débitos inscritos até 25.03.2015:
a) compensação de até 92% do montante atualizado do débito tributário ou não tributário (art. 2º, I);
b) os débitos a serem compensados não podem ter sido objeto de parcelamento incentivado anteriormente, como PPI ou PRD (art. 2º, I);
c) pode ser utilizado mais de um precatório para a compensação de um único débito inscrito (art. 2º, II);
d) pode ser utilizado apenas um precatório para a compensação de mais de um débito inscrito (art. 2º, II);
e) caso o crédito do precatório seja superior ao débito inscrito, o saldo será pago ao seu titular pelo critério de ordem cronológica de pagamento determinada pelo Município, ou seja, entra na vala comum do tratamento conferido pelos entes públicos aos precatórios (art. 2º, § 2º);
f) caso o valor do débito inscrito seja superior ao crédito do precatório, o saldo deverá ser recolhido ao Município em até 5 parcelas mensais (não inferior a R$ 300,00 para PJ), atualizada mensalmente pela Selic (art. 2º, § 3º);
g) comprovação da titularidade do precatório (art. 4º, I);
h) comprovação da inexistência de pendência ou desistência de qualquer impugnação, recurso, medida judicial visando invalidação ou alteração do montante do precatório (art. 4º, II)
i) inexistência de discussão judicial relativa ao precatório em ação rescisória (art. 4º, III);
j) comprovação da renúncia ao direito de ação, embargos à execução fiscal e recolhimento da sucumbência, se devida, mais encargos da cobrança judicial e extrajudicial incidentes sobre o débito inscrito (art. 4º, IV);
k) recolhimento da parcela não compensada (8% do débito inscrito) (art. 4º, V);
l) autorização para o Município levantar os valores depositados em juízo (art. 4º, VII, “a”).
Pode pedir a compensação:
a) o titular originário do crédito;
b) o sucessor por falecimento do titular originário, inclusive cessionário desde que, neste caso, tenha sido comunicado por petição protocolizada, ao Tribunal que determinou a expedição do precatório e também o órgão devedor ou, se for de natureza tributária, a Fazenda Municipal (CF, art. 100, § 14 c/c Lei 16953/18, art. 3º, § 1º, II). – o que autoriza a cessão desse crédito por parte do titular original, para terceiro, podendo ser cessionário desse direito, por exemplo, uma empresa que irá utilizá-lo para compensar seu passivo tributário inscrito até 25.03.2015;
c) cessionário com anuência do advogado que atuou na origem do precatório (art. 3º, § 2º) e apresentação do instrumento de cessão (art. 3º, § 4º);
d) todos os herdeiros ou espólio representado pelo inventariante (art. 3º, § 3º);
e) advogado, para compensação de seus débitos inscritos com honorários sucumbenciais (art. 3º, § 5º) ou honorários contratuais (art. 3º, § 6º).
O requerimento de compensação será apreciado por uma Comissão Especial de Julgamento de Requerimento de Compensação (art. 6º), de cuja decisão, se desfavorável, caberá um único recurso (art. 8º). Já se deferido, o interessado deverá efetuar o recolhimento do saldo residual do débito inscrito, no prazo de 15 dias sob pena de cancelamento do pedido ou efetuar seu parcelamento (art. 7º, § 1º).
Se autorizada a compensação a Procuradoria Geral do Município registrará a extinção ou a quitação parcial do precatório em seu sistema e informará sobre a compensação tributária ou não tributária à Secretaria Municipal da Fazenda (art. 9º, I e II) e comunicará ao Tribunal a extinção ou a quitação parcial do precatório (art. 9º, III).
Referida lei municipal será regulamentada até 10.09.2018 (art. 11).
SEGURANÇA NA AQUISIÇÃO DE PRECATÓRIOS
É possível antever que, porque agora regulamentado, o mercado de precatórios será muito mais seguro para as empresas contribuintes que os adquirirão de credores dos entes públicos (cedentes). De todo modo, recomenda-se que o pagamento pela aquisição desses créditos somente seja formalizado após confirmação de sua aceitação pelos Estados, DF e Municípios contra os quais sejam apresentados para compensação.
Franco Advogados Associados
29 de julho de 2018
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