quarta-feira, 16 de dezembro de 2020

Exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS/COFINS fundada no valor destacado na Nota Fiscal tem sido inscrita na Dívida Ativa

  

 


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Os argumentos Fazendário e as ilegalidades

 

A Súmula 436 do Superior Tribunal de Justiça dita que “A entrega de declaração pelo contribuinte reconhecendo débito fiscal constitui o crédito tributário, dispensada qualquer outra providência por parte do fisco”.


O contribuinte, suportado por sentença judicial transitada em julgado, isto é, aquela que não mais comporta qualquer recurso, promove a compensação tributária baseada no montante do ICMS que excluiu do PIS/COFINS pago indevidamente ao longo dos anos, isso é registrado em sua Escrituração Fiscal Digital (EFD). Paralelamente, ele entrega também ao fisco informações em Declaração de Débitos e Créditos Tributários Federais (DCTF). Ao cruzar ambos os documentos, o fisco estima qual o valor a ser compensado pelo contribuinte. 


Adotando em seus cálculos as regras da Solução de Consulta 13/2018 (http://bit.ly/2Jra2GI), ele, fisco, constitui o crédito tributário diretamente, sem antes promover o lançamento via auto de infração. E o pior, vem inscrevendo esse suposto crédito dele, na Dívida Ativa.


Para muitos contribuintes ter débito inscrito na Dívida Ativa pode significar problema muito sério ante a restrição de acesso a créditos públicos, ou mesmo perante bancos privados em decorrência de ter sido negativado junto aos órgãos de proteção de crédito, além de ficar impedido de obter certidão negativa de débitos de tributos federais (CND), de participar em licitações públicas, e, é óbvio, de a Fazenda Pública credora intitular-se a registrá-lo no CADIN (Cadastro Informativo de Créditos não Quitados do Setor Público Federal) e contra ele iniciar Execução Fiscal.


Ocorre que há alguns senões aí. O primeiro deles, e talvez o mais importante, é que ao entregar as declarações (EFD e DCTF) o contribuinte não está, em hipótese alguma, confessando a existência de débito equivalente àquele que o fisco apura e inscreve na Dívida Ativa. 


Uma coisa é declarar o exato montante que o contribuinte entende devido ao fisco e não o recolher, total ou parcialmente, hipótese em que aplicável a dita Súmula. Outra, bem diferente, é o contribuinte declarar o exato montante que entende devido, nele já considerados os efeitos da exclusão do ICMS do PIS/COFINS, e o fisco disto discordar – e, sem inaugurar o contraditório por meio de auto de infração oportunizando-se demonstrar seus cálculos e o contribuinte dele discordar, quer na instância administrativa ou judicial –, sem qualquer demonstração de seu suposto direito, inscrever a alegada diferença em dívida ativa.


Ou seja, a Súmula 436 STJ é absolutamente inaplicável neste caso, valendo unicamente para as situações em que o contribuinte declara, mas não recolhe o tributo, total ou parcialmente. Aí sim, constatando a inexistência de recolhimento, total ou parcial, autoriza o fisco a inscrever o débito na Dívida Ativa.


Notar que enquanto a Súmula 436 embasa o direito de o fisco exigir o imposto não recolhido tomando por parâmetro o montante total declarado como dívida pelo próprio contribuinte, a situação concreta objeto dos presentes comentários é muito diferente já que o fisco, por discordar, recalcula o débito declarado pelo contribuinte e inscreve a diferença então apurada.


Deixar de recolher parte ou totalidade do tributo amparado em decisão judicial transitada em julgado só pode ser contestado pelo fisco mediante prova dos valores compensados a maior que o devido. A única fonte de informação de que dispõe o fisco é aquela disponibilizada pelo contribuinte, na DCTF, evidenciando o valor do PIS/COFINS devido. E, na EFD, onde informa estar excluindo da base do PIS/COFINS o ICMS destacado na Nota Fiscal ao invés de, conforme vem ilegalmente exigindo o fisco, com base no montante apurado no livro fiscal de apuração do ICMS.


Entendam bem essa nuance: o informe, pelo contribuinte, da exclusão do ICMS da base das contribuições com suporte naquele destacado na NF não contém exata indicação do exato montante (que, após inscrição na Dívida ativa, transforma-se no quantum debeatur exigível mediante execução fiscal) por ele excluído mediante esse critério. 


Lembrando que o início de todo o processo de compensação tem lugar com a entrega do Pedido de Habilitação do Crédito. Ali é indicado o montante total do crédito, oriundo das exclusões do ICMS que o contribuinte tenha apurado. Mensalmente, ao efetuar a compensação, o contribuinte apresenta a Per-Dcomp, onde irá demonstrar a compensação efetiva. 


E isso se sucede mês a mês, até que ao final de um dado tempo, suponhamos dois anos, todo o montante do crédito, corrigido, terá sido efetivamente compensado. Antes disso, o fisco não dispõe de liquidez e certeza apta a lhe permitir, baseado em números concretamente informados pelo contribuinte, amparar sua alegação de liquidez, certeza e exigibilidade, atributos intrínsecos e inerentes ao título extraído após inscrição na Dívida Ativa! 


Ainda porque há relatos de que os contribuintes têm detectado erros nos cálculos realizados pelo fisco! Entretanto, estão impedidos de contestar tais cálculos na instância administrativa simplesmente por ser esta deliberadamente suprimida pelo fisco. Só poderá utilizar seu direito de defesa embasado em números, em ação ordinária própria, estratégia esta que embute os riscos de sucumbência. 


Portanto, já de saída, não pode a Fazenda aplicar a Súmula 436 do STJ para fundamentar sua pretensão. E não pode, neste caso, ante a absoluta ausência de elementos suficientemente consistentes, em ambas as declarações (DCTF e EFD) que lhes permitam determinar o exato montante, no seu entender, apurado em discrepância com a “orientação” estampada na SC 13/2018 (http://bit.ly/2Jra2GI), igualmente na IN 1911/2019 (http://bit.ly/2XpWWjX), se é que se pode chamar a esse mostrengo de “orientação” já por se tratar, a rigor, de puro arbítrio não amparado em lei. 


Segundo, débito exigível é aquele vencido e não pago, não mais sujeito a termo ou condição para a cobrança judicial ou extrajudicial (Portaria PGFN 33/2018, art. 1º, § 3º). 


Ora, o CTN dispõe que dívida ativa tributária é aquela proveniente de crédito tributário regularmente inscrito, depois de esgotado o prazo fixado para pagamento, pela lei ou por decisão final proferida em processo regular (CTN, art. 201, caput). Se não há lei autorizadora da inscrição e, nesses casos, a Fazenda Nacional tem suprimido – supostamente alicerçada na Súmula 436 STJ – o processo regular que obrigatoriamente deveria ter-se iniciado por meio de auto de infração, mais ainda, não fixa previamente prazo para seu pagamento, esse proceder não encontra amparo a não ser na arbitrariedade fiscal.


Ainda o CTN dispõe que o lançamento tributário é efetuado com base na declaração do sujeito passivo ou de terceiro, quando um ou outro, na forma da legislação tributária, presta à autoridade administrativa informações sobre matéria de fato, indispensáveis à sua efetivação (CTN, art. 147, caput). Só é permitido o arbitramento, pelo fisco, nas hipóteses em que o cálculo do tributo tenha por base, ou tome em consideração, o valor ou preço de bens, direitos, serviços ou atos jurídicos, e nesse caso mediante processo regular, sempre que ocorram omissões ou não mereçam fé as declarações ou esclarecimentos prestados (CTN, art. 148). 


Mas mesmo nesses casos é cabível a contestação, avaliação contraditória, administrativa ou judicial. Veja-se que não se trata de situação, no caso concreto, que nos termos do disposto no artigo 148, admita o arbitramento. 


Pergunta que cabe, no caso: como pode ser reconhecida a liquidez e certeza do débito se o fisco não explica ao contribuinte como calculou o montante que, na Certidão da Dívida Ativa expressa o seu suposto direito? E isso assume importância absoluta quando se constata que os contribuintes vêm detectando erros nos cálculos feitos pelo fisco!


Terceiro, a Solução de Consulta deu origem à Instrução Normativa 1911/2019. E esta, não apenas reduziu, sem base em lei, o crédito do PIS/COFINS comparativamente àquelas situações em que o contribuinte seja titular de decisão transitada em julgado, conforme poderá ser conferido em tabelas disponíveis (http://bit.ly/2XpWWjX), como também majorou o débito de ambas as contribuições nas mesmas situações em que presente título judicial em seu favor.


Em todos os casos sob nossa responsabilidade fomos ao Judiciário e obtivemos sentença favorável contra a aplicação da IN 1911/2019, inclusive obtendo o reconhecimento judicial de que o ICMS a ser excluído é aquele destacado nas Notas Fiscais.


Mas os contribuintes que não tenham conduzido essa providência, estarão agora mais fragilizados e deverão conduzir providências judiciais, conforme será visto na sequência.


Quarto aspecto é que o débito para ser inscrito na Dívida Ativa precisa preencher alguns requisitos: ser líquido, certo e exigível (Lei 6.830/80, art. 2º, § 3º). Apesar de sua inscrição conferir-lhe presunção de liquidez e certeza (Lei 6.830/80, art. 3º, caput), não prova sua exigibilidade (Portaria PGFN 33/2018).


Repita-se, débito exigível é aquele vencido e não pago, não sujeito a condição para sua cobrança judicial ou extrajudicial (Portaria PGFN 33/2018, art. 1º, § 3º). Mas nesse caso, duas condições existem e não foram observadas pelo credor fisco: lei autorizadora dessa inscrição – tanto que o fisco se funda na Solução de Consulta 13/2018 para alicerçar sua exigência –, e o prévio contraditório.

 

Resumo

 

  •       Súmula 436 STJ absolutamente inaplicável porque editada para utilização em situação diversa daquela ora fundamentada pela Fazenda Nacional.
  •       O arbitramento não é admitido pelo CTN na situação que vem embasando a inscrição na Dívida Ativa.
  •       A Solução de Consulta 13/2018 não é lei. Ela foi sucedida pela IN 1911/2019 que já recebeu, no Judiciário, sentenças contrárias à sua legalidade.
  •      Para embasar inscrição na Dívida Ativa a pretensão fiscal tem que comprovar liquidez, certeza e exigibilidade, ausentes neste caso.

 

Conclusão

 

Com o devido pedido de perdão aos contribuintes em geral, isso tudo só se prestará a engordar os honorários das bancas advocatícias na medida em que, nos casos em que incidirem sucumbência, a Fazenda será fragorosamente derrotada em mais esse embate e sucumbirá em favor dos causídicos no percentual situado entre 10% e 20% do valor discutido.


Essa sucessão de derrotas originadas de causas irresponsáveis já vinha ocorrendo massivamente até que a Fazenda Nacional resolveu introduzir a transação tributária, também como meio de evitar essas derrotas no Judiciário e condenações em sucumbência (http://bit.ly/2GfmN6A). 


Os contribuintes não titulares de sentença judicial favorável fundada na IN 1911/2019 que lhes assegure o direito de excluir o ICMS destacado na NF terão algumas alternativas cujas escolhas deverão ser mais apropriadas a cada caso concreto, porém serão mandatórias. Alguma, ou algumas, deverão ser obrigatoriamente eleitas: a) mandado de segurança contra as exigências postas na SC 13/2018 e, obviamente, contra a inscrição na Dívida Ativa; b) Anulatória de Débito Fiscal (se necessário, juntamente com Ação Declaratória de Inexistência de Relação Jurídico-Tributária); c) aguardar o início da execução fiscal para lá se defender através de Embargos à Execução.


É bem compreensível a estratégia empreendida pela Fazenda Nacional. A publicação do julgamento do RE 574.706/PR ocorreu em 02/10/2017. A PGFN ajuizou Embargos de Declaração na sequência, até hoje não julgado pelo STF, e sem previsão de quando o será. Enquanto isto, a decadência do direito da Fazenda de exigir essa diferença que vem sendo agora inscrita na Dívida Ativa prossegue seu curso, sem interrupção. 


Assim, optou por travar a prescrição que ocorreria em 2022, que sucede à decadência, por meio da inscrição diretamente na Dívida Ativa. Com isso conseguiu três efeitos, a saber, travar a decadência/prescrição; ganhar o tempo correspondente ao processamento do contraditório na instância administrativa que nesse caso inexiste; infernizar a vida do contribuinte mediante inscrição desse débito inexistente na Dívida Ativa causando-lhe transtornos. Mesmo que para isso tenha sido atropelada a Constituição e o CTN, bem como a Lei de Execução Fiscal.


Enfim, se tudo o que os empreendedores precisam é de segurança jurídica para empreender, manter-se e crescer, tudo o que não encontram em nosso País é exatamente isto, qualquer que seja o segmento, setor, área, inclusive na tributária, de modo que sem esse norte para tocarem a vida com atenção total àquilo que sabem fazer, isto é, gerar riquezas e emprego, produzir, comercializar, prestar serviços, sabendo de antemão qual sua margem líquida e quais as diretrizes para crescer, a total ausência desses parâmetros os deixam desnorteados, com justa razão. Nem mesmo uma decisão judicial transitada em julgado a que se obrigam as leis a respeitar (LINDB, art. 6º caput e § 3º), são observadas pelo fisco brasileiro! Não apenas o futuro, mas também o passado é incerto.


O espírito empreendedor há de um dia triunfar. E esse dia chegará quando tivermos um Judiciário forte e coeso na defesa das leis e da Constituição. Oxalá!

 

Franco Advogados Associados

16/12/2020

 

NOTA:

Os links para as matérias capazes de ampliar o entendimento do leitor estão todas inseridas ao longo deste texto.

 

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