segunda-feira, 17 de outubro de 2016

INVESTIMENTOS DE RISCO - START-UPS E INVESTIDORES-ANJO - COMO CONCILIAR INTERESSES RECÍPROCOS?

INVESTIMENTOS DE RISCO – START-UPS (EMPRESAS INICIANTES) E INVESTIDORES-ANJO – QUAL A MELHOR ALTERNATIVA JURÍDICA PARA O APORTE DE INVESTIMENTOS SEM RISCOS?



Como investir em empresas iniciantes sem incorrer em riscos patrimoniais além daqueles que são próprios do malogro do negócio? Sociedade em Conta de Participação (SCP) é a solução.

Assim como ocorre no mundo todo, há investidores brasileiros capitalizados esperando oportunidades para investir em empresas iniciantes, estas, a sua vez, sedentas por capital de risco a custos baixíssimos comparativamente às figuras tradicionais de acesso ao dinheiro. São os investidores-anjo.

A lógica dessa operação é: se o negócio naufragar, perde o investidor; já se for bem sucedido, todos ganham. Os sócios que iniciaram o projeto prosseguem expandindo-o, potencializando seu empreendimento. O investidor-anjo pode continuar no negócio, na condição de sócio, ou vender sua parte embolsando o ganho.

O problema é sempre representado pelo risco excepcional para o patrimônio do investidor. Ele aceita o risco próprio do investimento inicial em um projeto do qual os banqueiros fogem como o diabo da cruz – e no qual ele próprio pode perder tudo o que investiu –, mas não pode assumir, obviamente, riscos creditícios da empresa iniciante e, principalmente, passivos trabalhistas e tributários.

Há alguns anos participamos de uma disputa entre investidor e empresa da área de tecnologia. O investidor queria participar do negócio inicial, dando palpites e interferindo na gestão do negócio. Egresso de empresa de grande porte e aficcionado por controles internos, passou a engessar a condução do dia a dia da empresa. Seu investimento deu-se inicialmente na forma de empréstimo (mútuo) para a sociedade, posteriormente transformado em participação societária, de cujo capital decidiu retirar-se na sequência para, ante os riscos que passou a vislumbrar, preservar a posição de mutuante!

A queda de braço foi parar no Judiciário quando, ante o inevitável desentendimento entre os sócios da investida e o investidor, pretendeu ele executar o “empréstimo”. Ninguém pode pretender as vantagens da condição de mutuante e as de sócio, ao mesmo tempo! A disputa judicial favoreceu a empresa iniciante.

Nesse caso, emblemático, onde errou o investidor? Tanto ao optar pelo empréstimo, quanto por convertê-lo em participação no capital da start-up para, subsequentemente, retirar-se do capital. Obviamente o prejuízo para o investidor poderia ter sido muito maior que o capital aportado se a empresa investida tivesse se esvaído em dívidas perante seus fornecedores, ou, ainda, contraído dívidas trabalhistas ou tributárias, caso em que poria seu patrimônio pessoal em risco ao obrigar-se também por esses passivos.

Atualmente vários fatores induzem o Judiciário a desconsiderar a personalidade jurídica da sociedade para alcançar o patrimônio pessoal dos sócios. Na verdade essa solução transformou-se numa panaceia chegando às raias do abuso do instituto da despersonalização da pessoa jurídica, do qual os credores lançam mão sem qualquer critério e os juízes autorizam-no irresponsavelmente. E agora, com o agravante de que o advento do novo Código de Processo Civil recrudesceu essa tendência induzindo a intensificação da utilização desse instituto, portanto, maiores riscos para o investidor já que tem sido comum o endereçamento ao Judiciário de pedidos de ordens judiciais promovidos por credores, para a retenção de passaportes dos devedores, suspensão de sua carteira de habilitação e outras tantas bizarrices, assim qualificadas por não guardar qualquer correlação entre as medidas punitivas pleiteadas e o crédito pretendido.

Para fugir disso é desaconselhável tanto a participação no capital da start-up, quanto o empréstimo. A primeira opção, pelos riscos óbvios que embute, aqui já comentados. E, a segunda, porque o contrato de mútuo tem que ser complementado por todas as cláusulas necessárias para assegurar ao investidor que, em determinado prazo ou atingida determinada condição de desenvolvimento do negócio o empréstimo será convertido em participação societária.

Ocorre que, enquanto mútuo, o rendimento por ele propiciado é tributado na fonte em até 22,5% e,  sendo a mutuária, como é, constituída na forma de pessoa jurídica, há ainda incidência de IOF sobre o saldo devedor diário apurado ao final de cada mês, sobre o qual incide a alíquota de 0,0041% ao dia, sem limitação, mais uma alíquota fixa de 0,38% sobre o crédito disponibilizado, além de PIS/COFINS calculado sobre a receita financeira mensal.

Como fugir disto? A opção é aquela apontada no primeiro parágrafo: aporte financeiro na start-up por meio de sociedade em conta de participação (SCP), a qual é constituída por mero contrato entre investida e investidor para exploração de um mesmo empreendimento em benefício comum. Nos termos do Código Civil em vigor (arts. 991 a 996), trata-se de contrato de sociedade e não mero contrato de participação.

Esclareça-se: é contrato em que a start-up é a sócia que figura como parte em todos os atos praticados pela sociedade – sócia ostensiva, portanto –, responsabilizando-se integral e ilimitadamente pelas obrigações perante terceiros (CC, art. 1024 c/c art. 996).

Entretanto, o sócio participante – anteriormente denominado sócio oculto – tem direito de fiscalizar a gestão dos negócios mas não pode tomar parte nas relações do sócio ostensivo perante terceiros sob pena de responder solidariamente com ele pelas obrigações em que intervier. Além disso, o sócio ostensivo não pode admitir novo sócio sem o consentimento expresso do sócio participante (CC, art. 995).

Outra vantagem é que sendo liquidada a start-up entre as partes apenas será apresentada prestação de contas, o que assegura, quanto aos riscos da falência, por exemplo, que estes permaneçam com a empresa investida, não com o investidor (CC, art. 996).

Para garantia de que esses efeitos obrigacionais sejam assim tratados, aconselha-se que o contrato de SCP seja arquivado na Junta Comercial, afastando assim o risco de ser ela confundida com sociedade em comum, o que espraiaria para o sócio participante a responsabilidade ilimitada própria da start-up.

Todavia, fica isento de responsabilidade perante terceiros, além do que, por sua condição de sócio participante (oculto), não aparecerá perante o mercado em geral, inclusive concorrentes da investida, vantagem especial no caso de participar de mais de um empreendimento.

Não há quaisquer dos efeitos tributários acima comentados. O ganho de capital que o investidor-anjo eventualmente obtiver, claro, será tributado quando ele alienar a sua participação no negócio e o realizar.

Se inexistir participação direta do investidor-anjo e não se imiscuir ele no controle das atividades do empreendimento, terá seu patrimônio pessoal sempre preservado, o que significa alternativa que garante o atingimento do objetivo visado, isto é, assunção apenas do risco do insucesso do negócio, sem jamais assumir as obrigações próprias do empreendimento eventualmente mal-sucedido.

Com essa medida, simples, ganham tanto a start-up, sequiosa por capital que passe a afluir sem parcimônia para seu negócio, quanto o investidor-anjo, sedento por oportunidades que traduzam retorno ao seu capital investido, desde que com riscos mensuráveis, sem riscos inesperados e inquantificáveis.

Franco Advogados Associados

17.10.2016.















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