terça-feira, 30 de outubro de 2018

ICMS A SER EXCLUÍDO DA BASE DE CÁLCULO DO PIS/COFINS – PARTE II








ENTENDA O CASO

Em 23.10.2018 a RFB fez publicar a Solução de Consulta Interna COSIT (SCI) 13, documento de 30 laudas.

Votamos a esse tema dada sua relevância (http://bit.ly/2IaEYt9). 

Por ela a RFB se posicionou oficialmente sobre qual o ICMS a ser excluído da base de cálculo do PIS/COFINS.

Para sustentar sua tese, num dos trechos o Parecerista afirma que todos os Ministros do STF, inclusive aqueles que foram voto vencido na decisão que, a final, consagrou a tese dos contribuintes (STF – RE 574.706/PR de 15/03/2017, publicado em 02/10/2017), concluíram que o ICMS excluível é aquele resultante do confronto débito/crédito (princípio da não-cumulatividade próprio do ICMS), ou seja, dedutível é o ICMS recolhido aos cofres estaduais. Não pode ser excluído o ICMS destacado na NF.

SCI 13 – LEITURA OBRIGATÓRIA

Todos aqueles que por qualquer razão tenham interesse neste tema devem, necessariamente, ler a íntegra da SCI 13 ainda porque ela contém instruções de natureza operacional, o que demanda seu conhecimento, mesmo por parte daqueles que optarão por descumprir as orientações nela contidas, excluindo o ICMS destacado na NF ao invés de o ICMS apurado em conta gráfica (crédito menos débito).

A POLÊMICA

A afirmação do Parecerista atrás exposta não é verdadeira. A decisão do Supremo Tribunal Federal ou não contém tal afirmação, ou é em sentido contrário, especialmente o voto da Ministra Cármen Lúcia, Relatora para o processo, cristalizado em sentido exatamente oposto ao afirmado pelo Parecerista da RFB. Veja-se:

“ (...)
6. Poder-se-ia aceitar que a análise jurídica e a contábil do ICMS, ambas pautadas na característica da não cumulatividade deste tributo, revelariam que, assim como não é possível incluir o ICMS na base de cálculo da contribuição ao PIS e da COFINS, também não seria possível excluí-lo totalmente, pois enquanto parte do ICMS é entregue diretamente ao Estado, parte dele se mantém no patrimônio do contribuinte até a realização da nova operação.
Entretanto, a análise jurídica do princípio da não cumulatividade aplicado ao ICMS há que levar em consideração o conteúdo normativo do art. 155, § 2º, inc. I, da Constituição da República, ou seja, examina-se a não cumulatividade a cada operação:
(...)
7. Considerando apenas o disposto no art. 155, § 2º, inc. I, da Constituição da República, pode-se ter a seguinte cadeia de incidência do ICMS de determinada mercadoria:


INDÚSTRIA
DISTRIBUIDORA
COMERCIANTE
CONSUMIDOR
VALOR SAÍDA
100
150
200
-->
ALÍQUOTA
10%
10%
10%

DESTACADO
10
15
20

A COMPENSAR
0
10
15

A RECOLHER
10
5
5


Desse quadro é possível extrair que, conquanto nem todo o montante do ICMS seja imediatamente recolhido pelo contribuinte posicionado no meio da cadeia (distribuidor e comerciante), ou seja, parte do valor do ICMS destacado na ‘fatura’ é aproveitado pelo contribuinte para compensar com o montante do ICMS gerado na operação anterior, em algum momento, ainda que não exatamente no mesmo, ele será recolhido e não constitui receita do contribuinte, logo ainda que, contabilmente, seja escriturado, não guarda relação com a definição constitucional de faturamento para fins de apuração da base de cálculo das contribuições.
Portanto, ainda que não no mesmo momento, o valor do ICMS tem como destinatário fiscal a Fazenda Pública, para a qual será transferido.
8. Por ser inviável a apuração do ICMS considerando cada mercadoria ou serviço e a correspondente cadeia, resolveu-se adotar o sistema de sua apuração contábil. O montante de ICMS a recolher é apurado mês a mês, considerando-se o total de créditos decorrentes de aquisições e o total de débitos gerados nas saídas de mercadorias ou serviços. Esta é a chamada análise contábil ou escritural do ICMS.
(...)”

Resumidamente, porque o ICMS destacado na NF será em algum momento recolhido aos cofres da Fazenda Estadual, todo ele deve ser excluído da base de cálculo do PIS/COFINS, concluiu a Ministra Carmén Lúcia, relatora do RE 574.706/PR.

OS EFEITOS QUE ESSA DIFERENÇA CONCEITUAL TRADUZ

Para se ter uma ideia do efeito financeiro que desse entendimento da RFB exteriorizado na SCI 13 resulta, valemo-nos de quadro exposto na referida SCI:

ESPECIFICAÇÃO
PESSOA JURÍDICA

TOTAL DA CADEIA DE COMERCIALIZAÇÃO
INDUSTRIAL
ATACADISTA
VAREJISTA

VALOR DAS SAÍDAS             (NF Vendas)
1.000,00
1.500,00
1.800,00


ALÍQUOTA ICMS (operações internas)
18%
18%
18%


ICMS DESTACADO 
(débitos sobre vendas)
180,00
270,00
324,00
-->

774,00
ICMS A COMPENSAR (créditos sobre compras)
100,00
180,00
270,00
-->

550,00
ICMS A RECOLHER

80,00
90,00
54,00
-->

224,00


Vale dizer, se o ICMS excluído da base de cálculo do PIS/COFINS for aquele destacado na NF, no exemplo acima (no ciclo econômico ali exposto: indústria, atacado, varejo, comércio), totalizará R$ 774,00. Já se baseado no saldo débito/crédito (princípio da não cumulatividade, próprio e específico para o ICMS) defendido na SCI 13, R$ 224,00! Uma variação para menos de 71,06%!

O ERRO DE SE COMPARAR CONCEITOS NÃO AFINS

Essa variação percentual em prejuízo do contribuinte, apesar de expressiva, não é o que interessa aqui. O que interessa é a análise unicamente de conceitos jurídicos.

É muito comum ver, até mesmo entre advogados, a dificuldade de separar conceitos pré-jurídicos (econômicos, financeiros, contábeis, etc) de conceitos jurídicos, ou mesmo misturar conceitos jurídicos próprios de áreas distintas.

Veja-se que na SCI 13 o Parecerista vale-se do princípio constitucional da não cumulatividade, próprio e aplicável ao ICMS, para defender seu entendimento de que o ICMS excluível do PIS/COFINS é aquele apurado mensalmente com base no confronto entre débito e crédito do imposto.

O QUE DEVE SER JURIDICAMENTE COMPARADO

A base de cálculo do PIS/COFINS é a receita bruta, na qual incluem-se os tributos sobre ela incidentes (Lei 1598/77, art. 12, § 5º).

Ora, qual o efeito do julgamento do STF (RE 574.706/PR) senão a determinação de exclusão do ICMS da receita bruta?

Quando da receita bruta são excluídos os tributos sobre ela incidentes, tem-se a receita líquida.

Dito de outro modo, o STF decidiu que, para fins de determinação da base de cálculo do PIS/COFINS, exclusivamente em relação ao ICMS, a base de cálculo de ambas as contribuições é a receita líquida (receita bruta menos ICMS).

E qual é o ICMS utilizado na determinação da receita líquida? É aquele destacado na NF ou aquele apurado após o confronto da conta escritural de ICMS (crédito menos débito)?

A resposta é óbvia: excluído da receita bruta para determinação da receita líquida é o ICMS destacado na NF.

O princípio da não cumulatividade invocado pelo Parecerista para validar sua tese é instituto próprio do ICMS e que nada tem a ver com o conceito de receita bruta ou líquida.

Pode-se alegar estarmos aqui incorrendo no mesmo erro ao nos valermos de conceitos próprios da contabilidade e do imposto de renda aplicáveis na apuração do lucro real.

Essa alegação não prospera posto inegável que se a receita bruta é base de cálculo do PIS/COFINS e o STF mandou dela excluir o ICMS, o que resulta é receita líquida e, na apuração desta, o ICMS dedutível é exatamente aquele destacado na NF.

Não vale a aplicação dessa realidade conceitual para determinação da receita líquida (bruta menos ICMS) e, quando se trata de expurgar da base de cálculo do PIS/COFINS o ICMS nela incluso, concluir que dito conceito não mais deve ser aplicado, substituído por outro conceito: princípio da não cumulatividade do ICMS.

O que tem o princípio da não cumulatividade do ICMS a ver com receita líquida, afinal?

Tão verdadeira é a afirmação de que a exclusão do ICMS destacado na NF é aquele dedutível da base de cálculo do PIS/COFINS que, não tivesse relevância alguma – como quer o Parecerista ao invocar a LC 87/96 para concluir ter mera função de destaque e controle para o fisco – , na apuração da receita líquida seria indicado o saldo do confronto débito x crédito.

Enfim, e aqui está o corolário lógico: se da receita bruta é deduzido o ICMS destacado na NF é porque a receita bruta embutia esse montante o qual deve, em acatamento pleno à decisão do STF, ser excluído. Simples assim.

ESSA QUESTÃO NO STF

A propósito, imperativo esclarecer que, ao tentar reverter o “prejuízo” advindo de anos de, com o perdão da força da expressão, roubalheira encetada contra os contribuintes – o que torna esse suposto prejuízo inexistente –, a Procuradoria Geral da Fazenda Nacional (PGFN) obstinadamente concentrou esforços junto ao STF para convencê-lo a aplicar o seu entendimento a partir de 2019 (modulação de efeitos), com o fim de dar tempo para alterar sua legislação tributária aumentando as alíquotas para compensar as “perdas”.

Ao mesmo tempo em que postulou junto àquela Corte no sentido de ter definido qual é o ICMS a ser excluído do PIS/COFINS.

Fez isto em 31.10.2017 por meio de embargos de declaração, o qual não foi julgado e provavelmente não o será de vez que a modulação de efeitos deveria ter sido postulada em tempo próprio e não através de embargos de declaração.

É dizer, se nos termos da SCI 13 enfaticamente sustentado pelo Parecerista o tema já se encontra definido pelo STF, por que então a PGFN postular nesse exato sentido de esclarecimento por via de embargos de declaração?

Mais ainda: se a dúvida ainda se encontrava pendente de solução a justificar pedido de esclarecimentos ao STF, por que a SCI 13 passou por cima da decisão daquela Corte antecipando-se a ela ao definir algo que a ela ainda não definiu?

NOSSA POSIÇÃO SOBRE O CASO

Nosso entendimento é que esse episódio reforça escancaradamente a má-fé da administração pública nas suas relações com os contribuintes. Aqueles que se impressionarem com a força de uma Solução de Consulta, com o risco de autuação fiscal, etc., passarão a ou prosseguirão excluindo da base de cálculo das ditas contribuições o ICMS apurado via conta gráfica (crédito menos débito) e, nesses casos o fisco ganhará, e muito. No exemplo desenhado na SCI 13, esse ganho fazendário equivale a 245,54%.

Nosso posicionamento sempre foi no sentido de que o entendimento fiscal tem o mesmo valor do entendimento do contribuinte. A diferença – sua manifestação vincula o contribuinte e se desrespeitada implica em autuação fiscal – não deve impressionar porque quem a final decidirá será o judiciário.

E este, no único caso no julgamento do RE 574.706/PR a nosso ver detidamente explicitado – porém ignorado pelo Parecerista – já conta com uma manifestação favorável aos contribuintes. Além, é claro, da lógica jurídica aqui exposta.

Franco Advogados Associados
30 de outubro de 2018

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quarta-feira, 24 de outubro de 2018

Direito de crédito de PIS/COFINS
DESPESAS COM TRANSPORTE, HOSPEDAGEM, ALIMENTAÇÃO, AQUISIÇÃO DE EPI GERAM CRÉDITO DE PIS/COFINS 


O MECANISMO JUDICIAL UTILIZADO 


A definição do Superior Tribunal de Justiça (STJ), em abril/2018, sobre o critério legal que autoriza a apropriação, pelo contribuinte, de crédito de PIS/COFINS nas aquisições que faz, está trazendo alívio.

Por conta dessa definição a 20ª Vara Federal de Minas Gerais concedeu a uma empresa (Processo 1009225-78.2018.4.01.3800) o direito de apropriar créditos de PIS/COFINS oriundos de despesas com transporte, hospedagem, alimentação e aquisição de equipamentos de proteção individual (EPI) fornecidos aos seus empregados (Valor Econômico, 18/09/2018).

Chama a atenção o mecanismo processual utilizado: tutela de evidência. Normalmente seria utilizado o mandado de segurança, no qual jamais há o risco da sucumbência. Já a tutela de evidência, por ser uma espécie de liminar concedida no âmbito de uma ação ordinária, o risco sucumbencial está presente.

Por outro lado, o fato de o STJ já ter definido os tais critérios, essencialidade, pode-se dizer, com o perdão do trocadilho, foi essencial na decisão do juiz da 20ª Vara Federal mineira.

TUTELA DE EVIDÊNCIA

A tutela de evidência é decisão interlocutória – não sentença – concedida sumariamente quando o juízo vislumbra alta probabilidade ou quase certeza da existência do direito pleiteado. Semelhante em seus efeitos à liminar em Mandado de Segurança.

Dentre várias hipóteses, ela é concedida quando as alegações apresentadas pelo contribuinte, no caso, forem baseadas em julgamento de casos repetitivos ou em súmula vinculante. Esse requisito estava presente ante o precedente da 1ª Seção do STJ que definiu a essencialidade como condição para tomada desses créditos.

ESSENCIALIDADE

O conceito de essencialidade, aplicável para fim de apropriação de crédito de PIS/COFINS, coloca-o num grau acima ao de necessidade de incorrer em custos e despesas, utilizado para fim de determinação do lucro real (IRPJ). Para apropriação de crédito de PIS/COFINS não basta que custos e despesas sejam necessários. É imperativo serem essenciais ao desenvolvimento da atividade da empresa. Essencial ao processo produtivo. À atividade-fim.

Tome-se, por exemplo, a contratação, pela empresa, de despesas de propaganda. Elas certamente são necessárias (enquadram-se como tais para efeito de determinação do lucro real). Mas não contribuem, por si sós, para a produção/comercialização/prestação de serviços, ou seja, não atendem ao prescritivo legal que garante o direito de crédito nas aquisições de bens e serviços utilizados como insumos, inclusive na prestação de serviços (IN 247/2002 alterada pela IN 358/2003, art. 66 e IN 404/2004). 

Considere-se, agora, despesas de propaganda incorridas por empresa que explora produção de eventos. Nesse caso, mais que necessárias, são essenciais. Essencial quer dizer imprescindível para a produção (de bens ou serviços). Essencialidade dos gastos (insumos) condicionados à sua estrita aplicação na obtenção da receita oriunda da exploração do objeto principal da empresa (http://bit.ly/2x1wfVd).

O critério de essencialidade deve ser analisado em cada caso concreto.

O CASO CONCRETO

A Solução de Consulta Cosit 581/2017 da Receita Federal concluiu que equipamentos de proteção individual (EPI), uniformes, despesas com transportes e alimentação dos empregados não geram créditos de PIS/COFINS.

Tomando conhecimento dessa Solução de Consulta e atuando em atividade semelhante àquela da empresa que formulou a consulta, a autora da ação aqui mencionada, prestadora de serviços de engenharia de inspeção e avaliação de qualidade ajuizou ação perante a 20ª Vara Federal mineira. 

E obteve êxito, ao menos por ora, já que a Procuradoria da Fazenda Nacional certamente recorrerá dessa decisão. Vale, entretanto, o precedente, que acena em favor dos contribuintes nos casos em que os créditos estejam alinhados com o entendimento daquela Corte (STJ). E certamente será mantida a decisão favorável, no STJ, posto uniformizada com o entendimento dele.

CONCLUSÃO

Considerando que o custo tributário pode fazer a diferença entre ganhar mercado ou perdê-lo, é tendência, há anos, administrá-lo minuciosamente com lupa detectando onde pode ser reduzido. Eis aí um exemplo concreto em que a vantagem certamente contará a favor da empresa que tomou a iniciativa de perseguir seu direito no Judiciário, por entender que o detinha. Como se vê, acertou! Todos, igualmente, podem e devem ser diligentes.

Franco Advogados Associados
24.10.2018


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quinta-feira, 6 de setembro de 2018

FISCO CONCEDE MAIS UM ESTÍMULO AO PLANEJAMENTO SUCESSÓRIO




 



A rigor o título acima melhor ficaria se fosse: “Fisco Reconhece Mais Um Direito No Planejamento Sucessório”. Explica-se: é que a par de uma significativa vantagem no planejamento sucessório, em 30.04.2018 a Receita Federal (RFB), por meio da Solução de Consulta (COSIT) 38 uniformizou seu entendimento no sentido de que lucros ou dividendos pagos a usufrutuários de ações estão livres de tributação do IR.

A justificativa acerca do título, acima, tem lugar porque não se trata, no caso, de conceder, mas de reconhecer um direito já preexistente. 

Versa sobre uma Consulta formulada por um contribuinte, S/A de capital fechado, titular de usufruto de ações, que indaga à RFB se a receita decorrente do usufruto é lucro/dividendo e, sendo-o, como deve ser tratado para fins de tributação. Manifesta na Consulta seu entendimento de que sua percepção não deve ser incluída na base de cálculo de seu imposto de renda, tampouco deve haver retenção na fonte quando pago.

Ou seja, houve uma doação de ações em que o doador conservou, para si, o direito ao usufruto. 

Para melhor entendimento, a propriedade plena inclui não apenas ela própria, propriedade, como também a posse.

Quando o doador preserva para si o usufruto, transfere com a doação apenas a nua-propriedade. O direito de usar e fruir (usufruto) do bem doado permanece com ele, doador. Com isso, conforme a natureza do bem doado, rendimentos de alugueres, lucros, dividendos, etc., constituem direito exclusivo do doador-usufrutuário.

Exposto isto, vê-se que a SC 38 foi diretamente ao ponto jurídico central da questão com a seguinte afirmação: 

“ (...)

11. A partir dessas definições, é possível concluir que a constituição de usufruto conduz à alteração do beneficiário do rendimento produzido pela coisa, que deixa de ser o proprietário. Contudo, isso não é suficiente para alterar a natureza jurídica do rendimento recebido.

12. Com efeito, na propriedade plena, o proprietário é o titular de todos os atributos inerentes ao domínio, ao passo que, no usufruto, essa titularidade é dividida com o usufrutuário. Apesar disso, não há diferença de substância entre a titularidade de um e de outro em relação a cada uma dessas faculdades. Ou seja, os frutos recebidos mantêm sua natureza, quer sejam devidos ao proprietário, quer ao usufrutuário.”

Dito de outro modo, se por força do disposto na Lei 9249/95, art. 10, lucros/dividendos pagos ou creditados pela PJ (tributada pelo lucro real ou presumido) não são tributados na fonte, tampouco integram a base de cálculo do IR daquele (PF ou PJ) que os recebe, o fato de a propriedade plena ter sido cindida para ser atribuída a propriedade a0 usufrutuante (donatário) e uso e frutos ao usufrutuário (doador), não altera a natureza do bem gerador do rendimento, que no caso concreto são as ações.

E os rendimentos por elas gerados é que não são tributados (Lei 9249/95, art. 10), quer na fonte ou na Declaração Anual. Portanto, nesse caso irreleva a natureza jurídica da titularidade, plena ou parcial uma vez que o elemento gerador dos rendimentos (ações), por sua natureza não gera rendimentos tributáveis.

Como se vê, não comportaria outra conclusão diferente dessa exteriorizada na SC 38/2018 e que se revelasse juridicamente válida. Sua importância, com efeito, reside no fato de externar a posição oficial do fisco, afastando riscos de autuações. Até aqui o fisco entendia que usufruto deveria ser tributado por considerá-lo planejamento tributário abusivo, embora o Conselho de Recursos Fiscais (CARF) viesse, não unanimemente, reconhecendo o direito dos contribuintes.

Observação altamente relevante é que, apesar de a Consulta ter a ver no caso concreto especificamente com ações, mesmíssimo entendimento é integral e plenamente aplicável ao usufruto de quotas de capital. 

Extensível, segundo alguns, também aos juros sobre capital próprio, até aqui tributado na fonte à alíquota de 15%. Lembramos que o STJ, por sua 1.a Seção (Resp 1.200.492) já se posicionou no sentido de que JCPs, ao menos para efeito de tributação do PIS/COFINS, tem natureza jurídica tributária de faturamento independentemente de sua classificação contábil. Não tem natureza de lucros/dividendos.

Outro ponto merecedor de destaque é que o IR recolhido indevidamente no passado pode ser objeto de compensação já que os atos normativos expedidos pelo Fisco, como tais a SC 38/2018, como norma complementar da lei que é e por sua natureza interpretativa, retroage seus efeitos aos últimos 5 anos (CTN, arts. 100, I c/c 106, I).

Por outro lado, os autos de infração já lavrados podem ser revistos de acordo com o novo entendimento oficial da RFB por ser este mais favorável aos contribuintes. Aplicável, no caso, a interpretação mais favorável já por restar manifesta, anteriormente à SC 38/2018, a existência de dúvida, com esta sanada (CTN, art. 112).

Desse modo, aos benefícios do planejamento sucessório que permitem a um só tempo, não apenas mas também, organizar a sucessão para os herdeiros e economizar na tributação do IR sobre resultado da locação ou venda de imóveis; ITCMD sobre valor de mercado dos bens doados, substituído por seu valor de custo constante da Declaração do doador, acresce-se agora a não tributação do IR quando percebidos lucros/dividendos de PJ constituída para abrigar o patrimônio integralizado com bens e direitos, pelo doador-usufrutuário.

Cada caso em razão de suas peculiaridades vai expressar um benefício financeiro (tributário) – por exemplo, na futura exploração dos bens imóveis por meio de holding imobiliária (carga inferior a 7% na venda e inferior a 12% na locação) ao invés de nas PFs (carga igual a 15% na venda e 27,5% na locação) –, mas pode-se afirmar que, no geral, sempre haverá uma vantagem a justificar o planejamento sucessório. 

Dentre elas, aquela que assume absoluta importância: a organização patrimonial prevenindo disputas e custas potenciais para os herdeiros após o falecimento do detentor do patrimônio. 

Franco Advogados Associados


6 de setembro de 2018.


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