UBER EM SÃO PAULO – PROIBIÇÃO DE FUNCIONAMENTO – POR QUE ESSA
VEDAÇÃO É INCONSTITUCIONAL E ILEGAL EM SÃO PAULO E TAMBÉM EM TODO O BRASIL.
Esta matéria é escrita por quem
jamais utilizou o Uber, serviço de contratação de transporte de passageiros por
aplicativo de smartphone. Portanto, não advoga em favor de causa alguma, senão
em prestígio da constitucionalidade, legalidade e, sobretudo, do livre direito
de escolha que deve ser assegurado ao cidadão de optar por serviço de taxi, ou
Uber, aquele que melhor lhe convier.
A Câmara de Vereadores de São
Paulo aprovou a proibição do uso de carros particulares cadastrados em
aplicativos para o transporte remunerado de passageiros. O projeto foi aprovado
com emenda de autoria do Executivo, o qual autoriza a Prefeitura a conduzir
estudos visando o aprimoramento da legislação de transporte individual de
passageiros e o uso de novas tecnologias e serviços.
Afora parte a grande paixão
envolvida nessa discussão que coloca, de um lado, políticos com visão retrógrada
de que o estado pode tutelar tudo, dispondo inclusive sobre as livres escolhas – na melhor das hipóteses já que, na pior,
como indagou um participante de uma das audiências públicas aos nossos ilustres
vereadores: quanto eles estavam ganhando para tomar posição em favor dos
taxistas (!?!) – e, de outro, uma inovação que veio sacudir o marasmo dos profissionais
taxistas que prestam serviço de qualidade duvidosa, merece ênfase o fato de que
a vedação posta no projeto que segue para sanção do prefeito não tem base
constitucional, tampouco legal, porquanto a Constituição não autoriza tal
vedação, tampouco o Código Civil.
Compete à União instituir
diretrizes para o desenvolvimento urbano, inclusive transportes urbanos (CF,
art. 21, XX), e privativamente a ela, legislar sobre diretrizes da política
nacional de transportes (CF, art. 22, IX e XI). Por outro lado, compete aos
Municípios, organizar e prestar, diretamente ou sob regime de concessão ou
permissão, os serviços públicos de interesse local, incluindo transporte
coletivo (CF, art. 30, V).
No capítulo da Ordem Econômica ou
Financeira, a lei disporá sobre a ordenação dos transportes terrestres (CF,
art. 178, caput), além do que no mesmo capítulo é garantida a livre iniciativa,
que tem por fim assegurar a todos existência digna, observados os princípios:
propriedade privada, livre concorrência, defesa do consumidor, busca do pleno
emprego e o livre exercício de qualquer atividade econômica, independentemente
de autorização de órgãos públicos, salvo nos casos previstos em lei (CF, art.
170 e par. único).
Só isso já seria o bastante para
provar porque o executivo paulistano não pode vedar a livre iniciativa daqueles
que, dispondo de veículo de qualidade muitas vezes superior à dos taxis,
tratamento dispensado ao passageiro idem, além do que, limpeza pessoal e do veículo
comparativamente melhor, se propõem a utilizar seus veículos para a exploração
dessa atividade.
Mas não para aí. O Código Civil
assegura a todos a liberdade de contratar, desde que o objeto (transporte) seja
lícito, as partes contratantes (motorista e passageiro) tenham capacidade civil
para contratar e o façam de acordo com a forma prevista na lei (CC, art. 104).
No caso concreto, tanto a
Constituição quanto o Código Civil asseguram aos prestadores de serviços de
transporte via Uber o direito de prosseguirem prestando esse serviço. Pode-se
alegar, com justa razão, tratando-se de transporte público de passageiros, ser
necessária lei municipal que permita tal atividade mediante concessão ou
permissão (CF, art. 30, V). Está correto esse entendimento. Mas isto só tem um
efeito, o qual deriva diretamente da Constituição, qual seja, impor à
municipalidade uma obrigação: regulamentar a atividade de transporte via Uber,
jamais vedá-la. E, no plano nacional, a União precisa legislar sobre o tema
(CF, art. 21, XX e 22, XI e XI). Tais obrigações estatais derivam do princípio
de que, como agente normativo e regulador da atividade econômica, o estado
exercerá, na forma da lei, as funções de fiscalização, incentivo e
planejamento, sendo este apenas indicativo para o setor privado (CF, art. 174,
caput).
Em outras palavras, a
municipalidade não tem poder algum de vedar. Tem sim, somente dever
constitucional de disciplinar a atividade. Nada mais que isto.
Cogita-se muito, sobre a
disparidade entre ambas as atividades em desfavor do serviço de taxi. Pura
balela. Um comparativo feito pela Revista Veja há alguns meses provou que os
custos anuais do motorista do Uber é maior que o dos taxistas já que não dispõem
de algumas vantagens substantivas as quais os taxistas gozam: isenção de IPI e
ICMS (cerca de 27% do custo) na aquisição de veículos, isenção de rodízio uma
vez por semana, trafegar em área destinada a ônibus. O fato de os taxistas
serem obrigados a pagar alvará e taxa municipal para exercer a profissão, serem
fiscalizados pelo Departamento de Transporte Público não invalida a conclusão acima,
pois, na verdade, esconde uma brutal distorção, a qual obriga aqueles que
queiram ingressar na atividade a pagar mais de R$ 200 mil para obter um alvará
no mercado negro pois a prefeitura, há anos, se limita na autorização a cerca
de 35 mil taxistas. A prefeitura é obrigada, pois, ao invés de proibir a
atividade, regulamentá-la.
Notar que ela não tem poder algum
para se recusar a conduzir tal providência já que isto fere a Constituição e o
Código Civil. Enquanto isto, os profissionais que utilizam seus veículos próprios
para a exploração da atividade não podem ser vedados de fazê-lo ante a inexistência
de norma que os proíba de exercê-la, posto que no âmbito das relações privadas (motorista
e passageiro), o que não é proibido é permitido. Se tal relação privada tem
implicações na esfera pública por se tratar de transporte público de
passageiros, que a administração a discipline, jamais a vede pois isto é
flagrantemente inconstitucional e ilegal.
Essa discussão finca pé num
paralelo: prostituição. Esta também não é regulada, mas é permitida, e sem
qualquer interferência do poder público. Poder-se-ia alegar que tal comparação
não tem lugar posto não se tratar de atividade que, como o transporte, afete o
público. Como não? Afeta a saúde pública, dentre elas, a mais letal, a Aids,
que é dever do estado controlar.
Portanto, essa discussão
conduzida na Câmara Municipal paulistana não poderia ter vindo em melhor hora. É
hora de, definitivamente, tirar o poder da administração pública de se imiscuir
nas escolhas privadas como se cada um de nós fosse incapaz de eleger suas opções,
como se para cada ação requeresse a intervenção do estado ditando o que é
melhor, expresso por exemplo, na proibição recém imposta aos paulistanos de
comer foie gras!
A hora é esta porque a insatisfação
popular está explodindo na exaltação dos ânimos do paciencioso povo, que parece
não mais aceitar o lhe é imposto, e,
com o perdão do trocadilho, impaciente inclusive com a imensa carga deste, cujo ônus vem suportando, sem o
esperado retorno na qualidade dos serviços públicos e que, após anos de
desatinos econômicos, verdadeira farra com o seu dinheiro, é agora chamado a
contribuir com mais recursos, sendo que empresas públicas que poderiam ser
vendidas, não o são, concessões públicas que deveriam ser imediatamente
conduzidas, tampouco o são. Ou seja, a máquina pública prossegue imensa, sendo
que se diminuída contribuiria, e muito, para a entrada de recursos no Tesouro.
Afinal, por que o estado, em suas
três esferas, não se limita a cuidar – e bem –, da saúde, educação e segurança,
funções básicas que justificam sua existência? Quem disse que precisamos de
empresas públicas ou economia mista em áreas nas quais estas já não mais se
justificam, como Petrobrás e tantas outras ...brás? Para que isto? Para nosso
dinheiro de contribuinte ser, através delas acintosamente roubado? Basta!
Franco Advogados Associados
10.09.2015
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